Terça-feira, 26 de Junho de 2007
O Corvo
Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais
«Uma visita», eu me disse, «está batendo a meus umbrais.
É só isso e nada mais.»
Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão) a amada, hoje entre hostes celestiais —
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundindo força, eu ia repetindo,
«É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isso e nada mais».
E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
«Senhor», eu disse, «ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi...» E abri largos, franquendo-os, meus umbrais.
Noite, noite e nada mais.
A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais —
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
Isto só e nada mais.
Para dentro estão volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
«Por certo», disse eu, «aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.»
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
«É o vento, e nada mais.»
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais.
Foi, pousou, e nada mais.
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
«Tens o aspecto tosquiado», disse eu, «mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.»
Disse-me o corvo, «Nunca mais».
Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
Com o nome «Nunca mais».
Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, «Amigo, sonhos — mortais
Todos — todos lá se foram. Amanhã também te vais».
Disse o corvo, «Nunca mais».
A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
«Por certo», disse eu, «são estas vozes usuais.
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
Era este «Nunca mais».
Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
Com aquele «Nunca mais».
Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sombras desiguais,
Reclinar-se-á nunca mais!
Fez-me então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
«Maldito!», a mim disse, «deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
«Profeta», disse eu, «profeta — ou demónio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais,
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
«Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!, eu disse. «Parte!
Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!»
Disse o corvo, «Nunca mais».
E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais,
E a minh'alma dessa sombra, que no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!
Edgar Allan Poe
(Tradução de Fernando Pessoa)
Domingo, 24 de Junho de 2007
Que rica família
Foto extraída da Revista Istoé, de 13 de Junho de 2007
Rir é correr o risco de parecer tolo...
"Rir é correr risco de parecer tolo.
Chorar é correr o risco de parecer sentimental.
Estender a mão é correr o risco de se envolver.
Expor seus sentimentos é correr o risco de mostrar seu verdadeiro eu.
Defender seus sonhos e idéias diante da multidão é correr o risco de perder as pessoas.
Amar é correr o risco de não ser correspondido.
Viver é correr o risco de morrer.
Confiar é correr o risco de se decepcionar.
Tentar é correr o risco de fracassar.
Mas os riscos devem ser corridos, porque o maior perigo é não arriscar nada.
Há pessoas que não correm nenhum risco, não fazem nada, não têm nada e não são nada.
Elas podem até evitar sofrimentos e desilusões, mas elas não conseguem nada, não sentem nada, não mudam, não crescem, não amam, não vivem.
Acorrentadas por suas atitudes, elas viram escravas, privam-se de sua liberdade.
Somente a pessoa que corre riscos é livre!" - Seneca (Orador Romano)
Abismo
"Quem luta com monstros deve velar por que, ao fazê-lo, não se transforme também em monstro. E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti" - Friedrich Nietzsche
Sábado, 23 de Junho de 2007
S. João em Braga
Fotos com História
O S. João em Braga faz parar a cidade.
"A noite de S. João, noite misteriosa por excelência, é festejada com especial gozo e ternura, hoje, com os martelinhos, alho porro, o cheiro dos manjericos (Ex-Libris da quadra), saltos à fogueira e arraiais com os seus tradicionais bailaricos. Desfila o povo e as típicas rusgas Sanjoaninas a caminho do parque de S. João da Ponte, onde junto à capela do orago tem lugar um animadíssimo arraial. Após a noitada de S. João, o dia, em que a cidade engalamada vê passar a bela procissão festiva e tradicional "Cortejo do Rei David", no qual o rei vai acompanhado da sua numerosa corte e do carro dos pastores, sendo, por fim, representado e dançado um auto medieval que o povo de Braga conservou até aos nossos dias". (Fonte: Site da C.M. Braga).
Sexta-feira, 22 de Junho de 2007
Top 10 das coisas que mais me irritam
1) Condutores a circularem de vidro aberto e com o braço de fora pendurado, qual presunto de chaves;
2) Condutores que teimam em circular na A.E. pela faixa esquerda;
3) Condutores que teimam em não fazer o sinal de pisca quando mudam de direcção;
4) Paus mandados, ou os yes man;
5) Mentirosos;
6) Caloteiros;
7) Pessoas que acham que se têm de dar bem com toda a gente;
8) Golpistas em filas de espera, trânsito incluído;
9) Empregados de mesa com a mania que são engraçados;
10) Incompetentes, nas mais variadas versões.
Quarta-feira, 20 de Junho de 2007
UnI: José Sócrates apresentou queixa-crime contra bloguer
A notícia que se segue foi extraída, na sua totalidade, do endereço http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=12&id_news=281876, e a razão de aqui a reproduzir prende-se com o facto de querer apelar para a mais completa reflexão, por parte dos leitores deste blog.
Citando: O primeiro-ministro, José Sócrates, apresentou uma queixa-crime contra o blogger António Balbino Caldeira, professor em Alcobaça, devido ao conjunto de textos que escreveu sobre a sua licenciatura em Engenharia Civil na Universidade Independente (UnI), noticiou hoje o Expresso na edição on-line, citando fonte próxima do processo.
O autor do blogue «doportugalprofundo.blogspot.com» vai ser ouvido no mesmo dia no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) de manhã como arguido e à tarde como testemunha.
Esta dupla condição resulta do facto de o DCIAP estar a conduzir dois processos sobre a licenciatura do primeiro-ministro na UnI: um que teve origem numa participação feita pelo advogado José Maria Martins, que levantou suspeitas sobre a passagem de Sócrates pela UnI, e no qual o bloguer será ouvido como testemunha, e um segundo que foi aberto após a queixa-crime do primeiro-ministro contra António Balbino Caldeira. Ambos os inquéritos estão a correr paralelamente, adianta o jornal.
Contactado pelo Expresso, António Balbino Caldeira não quis prestar qualquer declaração.
O gabinete do primeiro-ministro não confirmou a apresentação de uma queixa-crime. No último post colocado no blogue sobre a sua condição de arguido, António Balbino Caldeira escreve: «O sistema persegue politicamente os seus opositores por estes pretenderem exercer os seus direitos de cidadania. Mas só sobrevive com a complacência dos órgãos do Estado e a resignação popular». - Fim de citação
20-06-2007 14:37:38
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